Frederico Trajano, do Magazine Luiza, fala dos seus planos
Fred Trajano. no Luiza Labs: equipe jovem e hackatons para renovar o Magazine Luiza
Gabriel Ferreira, da VOCÊ S/A
A sede do Magazine Luiza, um escritório de 6 000 metros quadrados
localizado sobre a principal loja da rede, fica na Marginal do Tietê, na
Vila Guilherme, em São Paulo. Mas é a algumas quadras dali, num espaço
de paredes grafitadas, com cara de startup, que um dos principais grupos
varejistas do Brasil se prepara para enfrentar as transformações que as
novas tecnologias têm imposto ao varejo.
Nesse local, onde o traje oficial é tênis e bermuda, 64 profissionais,
entre programadores, designers e especialistas em big data, fazem
hackatons — maratonas de programação que duram até 30 horas — para criar
soluções inovadoras para o e-commerce da rede. Quem comanda esse time
de nerds é Frederico Trajano, de 40 anos, herdeiro e diretor de
operações da empresa.
Nesta entrevista, ele fala sobre seus planos para o Magazine Luiza,
sobre as principais tendências do varejo mundial e sobre o novo perfil
dos profissionais da área.
Que desafios a tecnologia vem trazendo ao varejo?
Estamos apenas no começo de uma revolução. A função da loja vai mudar
muito. Ela vai ter de ser divertida, didática, sensorial e vai ter de
estar cada vez mais próxima do cliente, que pode resolver comprar pela
internet e retirar na loja. Teremos de ir além da transação.
Quem não fizer isso vai fechar as portas. Além disso, as lojas serão
mais enxutas e planejadas para proporcionar uma ótima experiência de
compra. Todo o resto terá de ser automatizado. Quem tiver custo alto não
vai conseguir competir com o comércio online.
A tecnologia cria oportunidades de venda em lugares inesperados, onde
nunca tivemos ponto físico. Mas o concorrente de fora também ficou mais
próximo. O caso do site Alibaba, que afeta o mercado de confecção, é
emblemático.
Até bem pouco tempo atrás, a C&A não tinha de se preocupar com o
vendedor chinês, porque importava dele. Agora o Alibaba está vendendo
direto para o cliente final. E você pode ter também concorrentes
startups, que fazem o negócio de um jeito que você nem imaginava ser
possível.
E como isso afeta o perfil dos profissionais que atuam no varejo?
O profissional do varejo tem de ser ainda mais centrado no cliente do
que já é. Afinal, o concorrente está a um clique de distância. Ele tem
de ser alguém capaz de entender e, preferencialmente, de desenvolver
tecnologia. Precisamos também de quem entenda de todas as potenciais
formas de prospecção de clientes online, como mídias sociais e
otimização de buscadores.
O novo profissional do varejo é menos intuitivo do que no passado. Ele
precisa ter muito mais base para tomar uma decisão. E hoje você conta
com um enorme volume de informações, o chamado big data, disponível para
isso.
Para concluir, esse profissional tem de ser muito mais rápido. Se o
varejo já era ágil, agora é ainda mais. O prazo entre criar projetos e
lançar novas plataformas tem de ser mais curto. Há empresas pequenas que
conseguem desenvolver coisas muito rapidamente. E coisas relevantes.
Como o Magazine Luiza está se preparando para essas mudanças?
Eu criei um laboratório de desenvolvimento e inovação, o Luiza Labs. É
uma estrutura separada de nosso escritório, totalmente focada em criação
de novas soluções. Esse é um grande marco para uma empresa varejista.
Fizemos muita coisa bacana lá, como nossa vendedora virtual e uma
plataforma de vendas pelo Facebook, considerada uma das mais eficientes
do mundo.
Nós fomos a primeira empresa do setor a conseguir um financiamento do
Finep para desenvolvimento tecnológico. A empresa soube entender que
houve uma revolução e está trabalhando duro para ser mais relevante para
o consumidor.
Qual o perfil do time desse laboratório?
O perfil da equipe digital é de pessoas mais jovens, nativos digitais,
com espírito empreendedor muito forte, que só estão felizes na companhia
enquanto estão empreendendo — um perfil bem diferente do antigo
profissional do varejo.
É uma turma que procura propósito nas coisas que faz. E são muito mais
informais. Não gostam de burocracia nem de estruturas hierárquicas muito
rígidas. Isso é característico do pessoal de digital em geral.
O pessoal do Luiza Labs tem tudo isso mais uma pitada de loucura. É uma
turma muito criativa, que curte muito aprender um com o outro. Eles têm a
cara da Campus Party. São nerds assumidos. E a gente tem de fazer
coisas diferentes para atrair esse pessoal. Eu tive de liberar o
trabalho de bermuda, por exemplo.
Foi um choque de cultura trazer esse time para uma empresa que ainda é vista como tradicional?
A empresa sempre foi muito cabeça aberta. Na década de 90, minha mãe
quebrou as paredes e cortou a burocracia. O DNA da companhia sempre foi
de uma startup. É uma empresa que tem atitude de dono, como as startups.
O Magazine sempre dispôs de muitos elementos de startup, mesmo quando
isso não era tão popular, e isso se alinha bem com esses jovens. Mas é
claro que tivemos de nos adaptar um pouquinho e aumentar nosso nível de
informalidade.
Como atrair esses jovens profissionais?
Hoje, nossos processos de trainee são muito mais digitais do que eram no
passado. Fazemos muito recrutamento online. Temos de procurar onde esse
cara está: na comunidade digital, nos fóruns de tendência, nos fóruns
de tecnologia.
Mas, além de contratar os nativos digitais, é preciso pegar outros que
não são e transformá-los nesse perfil. Eu mesmo não sou um nativo
digital. Estudando, passei a entender o assunto. Tem muita gente boa,
muito competente, que tem os valores da empresa e que só precisa
aprender uma ou outra técnica.
Trocar a equipe é um atalho muito pouco corajoso. Se eu quero
digitalizar meu cliente, tenho de começar digitalizando minha equipe
para poder fazer isso ainda melhor com o cliente. Eu não posso dizer
para meu consumidor que ele está velho e que só quero vender para gente
jovem.
Como você está digitalizando a equipe?
Nós levamos 15 anos para formar uma boa equipe digital. E essa equipe
agora tem como principal atribuição treinar o resto de nosso pessoal,
que em alguns casos está na casa há 30 anos. Quem já conhece tem de
transmitir o que sabe. No último seminário com os líderes (que envolveu
desde gerentes de loja até executivos do escritório), nós fizemos
oficinas digitais.
Falamos de social media, de mobile, de big data. E foram os próprios
funcionários da companhia que prepararam o treinamento, em um modelo
inspirado no TED (site de palestras). Mas qualquer um pode desenvolver
esses conhecimentos, seja qual for sua formação original. O universo
digital proporciona muita oportunidade de autoaprendizado, e o
profissional pode correr atrás desse tipo de informação.
Então o profissional habituado ao varejo tradicional não vai perder espaço?
Não necessariamente. Mas ele precisa querer evoluir. Ele tem de entender
que o mundo está mudando e que, se ele não mudar, vai ser pego de
surpresa. Esse profissional normalmente é de ótima execução, entrega
resultado, encanta cliente, e são talentos e capacidades que não vão
mudar.
Temos gerentes de loja de mais de 60 anos de idade que são
superdigitais. São pessoas que vão usar a tecnologia para fazer melhor
seu trabalho, o que é apenas um jeito novo de fazer a mesma coisa.
Fonte: http://exame.abril.com.br/revista-voce-sa/noticias/frederico-trajano-do-magazine-luiza-fala-dos-seus-planos
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